O Supremo Tribunal Federal (STF) sediou nesta terça-feira (21) o seminário internacional “Mecanismos nacionais de implementação de decisões estruturais: diálogos com o sistema interamericano e experiências comparadas”, realizado em parceria com o Instituto Max Planck e a Fundação Konrad Adenauer.

Os painéis reuniram especialistas brasileiros e de diversos países da América Latina, que apresentaram as realidades de cada local em relação ao sistema interamericano de Direitos Humanos. Falaram representantes da Costa Rica, do México, do Chile e da Colômbia, além do Brasil.

Experiências comparadas

No primeiro painel, voltado ao debate de experiências comparadas, a secretária de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da Informação do STF, Patrícia Perrone Campos Mello, explicou como o Supremo atua para fiscalizar o cumprimento de medidas adotadas em casos estruturais de direitos humanos.

Ela citou, como exemplo, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 347), que reconheceu o estado de sucessivas violações a direitos fundamentais nos presídios brasileiros, e a ADPF 635, sobre letalidade policial nas comunidades do Rio de Janeiro. Em ambos, o STF acompanhou o cumprimento das decisões por meio de uma assessoria dedicada a casos considerados estruturais. “O Supremo foi provocado com um novo tipo de demanda e reagiu criando novas estruturas capazes de responder a essas demandas, se reformulou e buscou apoio interdisciplinar”, afirmou.

A coordenadora científica da Unidade de Monitoramento e Fiscalização (UMF) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Flávia Piovesan, detalhou os desafios e as dimensões da iniciativa na fiscalização e na implementação de decisões proferidas pela Corte e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Diálogos com o sistema interamericano

O segundo painel teve como tema “Diálogos com o Sistema Interamericano de Direitos Humanos”. A moderação ficou por conta de Hartmut Rank, diretor do Programa de Estado de Direito para a América Latina da Fundação Konrad Adenauer. Para ele, o diálogo entre organismos, sociedade civil e academia com os Estados e a população em geral é essencial. “Essa conversa permitiu construir uma jurisprudência interamericana cada vez mais forte e que responde às necessidades atuais da nossa região, como as crises climáticas e ataques sistemáticos a pessoas defensoras dos direitos humanos”, declarou.

O painel foi totalmente composto por mulheres. A primeira a falar foi Gabriela Pacheco, diretora de supervisão do cumprimento de sentenças na Secretaria da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ela chamou a atenção para o impacto do cumprimento das reparações com a garantia de que não haverá repetição. “São medidas de caráter estrutural, que tratam de políticas públicas, normalmente complexas e difíceis de serem cumpridas. Atualmente, há 295 casos em supervisão na Corte, sendo 11 no Brasil, o que envolvendo mais de 1,5 mil medidas em supervisão, 87 delas no Brasil”.

Diretora executiva do Centro pela Justiça e o Direito Internacional, Viviana Krsticevic disse que a supervisão das decisões estruturais é a chave para a implementação das ordens da Corte Interamericana e melhorar o impacto e a efetividade do sistema de proteção a nível nacional e internacional. “Essa é a forma de cumprir as promessas feitas a pessoas e nações de que haverá direitos, de que haverá proteção internacional desses direitos por meio de um sistema de garantias interamericano, sistema esse que foi tão importante na história da nossa região e na proteção da democracia”, afirmou.

Para Melina Girardi Fachin, vice-diretora e professora associada do curso de Direito da Universidade Federal do Paraná, as desigualdades históricas e estruturais que marcam nossa região estão refletidas nas sentenças e resoluções firmadas pela Corte Interamericana. Ela defende a formulação de uma teoria constitucional que responda a essas desigualdades. “É possível pensar, a partir de problemas comuns que surgem como eixos estruturais, um projeto transformador para enfrentar violações graves dos direitos humanos. No constitucionalismo brasileiro, temos o bom exemplo dos avanços em matéria de proteção dos direitos das mulheres”, destacou.

Andréa Pochak, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, apresentou um documento aprovado em março deste ano que elabora pautas mínimas para a formulação de recomendações pelo sistema interamericano. “As decisões da Comissão se caracterizam por serem amplas e ambíguas, e isso não ajuda na implementação. Diante dessa autocrítica, entendemos que é preciso ajudar a redigir melhores recomendações, de forma a facilitar o trabalho de quem está no sistema interamericano”, ponderou.

Experiência brasileira

O terceiro e último painel do dia abordou a experiência brasileira sobre direitos humanos e foi moderado pelo desembargador Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, coordenador da Unidade de Monitoramento e Fiscalização (UMF) das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos do CNJ.

A primeira exposição foi da vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), Germana de Oliveira Moraes, que mostrou decisão da Corte IDH que reconheceu o direito de propriedade coletiva de 2.354 famílias indígenas em conflito de território na Terra Indígena Xucuru, em Pernambuco. “Um processo desse tipo é um processo de descolonização, em que se muda a mentalidade sobre os direitos dos povos indígenas, algo impensável há menos de um século”, observou.

A juíza auxiliar do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) Karina Ferraro Amarante falou sobre os desafios de seu tribunal no cumprimento da recomendação do CNJ para criar unidades de monitoramentos locais a fim de fiscalizar decisões da Corte IDH. A seu ver, é necessário haver uma formação acadêmica sólida em direitos humanos para superar barreiras à implementação desse novo sistema de justiça e efetivação das decisões.

A chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais do Ministério de Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) Clara Martins Solon ressaltou que cabe ao seu setor articular, no Brasil, a implementação dos atos necessários ao cumprimento das decisões internacionais nos casos de violações de direitos humanos, principalmente na efetivação de políticas públicas. Segundo ela, falta conhecimento das instâncias federais, estaduais e municipais em relação ao sistema interamericano de direitos humanos.

A promotora de Justiça do MP-ES Andrea Teixeira de Souza destacou acordo de cooperação firmado em fevereiro de 2023 entre a Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e a Corte IDH. O intercâmbio teve o objetivo de difundir instrumentos internacionais para promoção e defesa dos direitos humanos no âmbito do MP brasileiro. Segundo ela, congressos, seminários e conferências têm contribuído para a capacitação e a difusão da cultura de direitos humanos entre os membros do MP.

Em seguida, a defensora pública da União Daniela Correa Jacques Brauner afirmou que, além da atuação individual, a DPU também estrutura as atividades de promoção e proteção dos direitos humanos a partir de 16 grupos de trabalho. São diversos temas que envolvem a defesa de grupos vulneráveis como comunidades indígenas e quilombolas, mulheres e pessoas em situação de prisão, vítimas de tortura, trabalho escravo e tráfico de pessoas, catadores, crianças e migrantes, entre outros.

Lançamentos

O seminário chegou ao final com o lançamento de três livros. As obras “Caderno de Jurisprudência do STF – Concretizando direitos humanos sobre direitos das pessoas privadas de liberdade”, “Comentario al procedimiento ante el Sistema Interamericano de Derechos Humanos”, da Fundação Konrad Adenauer, e a “Coletânea sobre Controle de Convencionalidade”, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foram apresentadas na Suprema Corte. Participaram da solenidade de lançamento no STF a professora Flavianne Nóbrega, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Miguel Barbosa, da Fundação Konrad Adenauer, e Flávia Piovesan, do CNJ.

PN, JM, EC//CF

 

Com informações do STF

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